God, Sky & Land: Genesis 1 as the ancient hebrews heard it – Brian Bull and Fritz Guy

junho 26, 2012

[…]Alguém com a firme convicção de que o fluxo de inspiração sempre flui diretamente de Deus ao profeta, sem nenhuma ondulação ou perturbações, e que Genesis é para ser entendido como algo vind de Deus para o profeta escrever, pode razoavelmente  concluir que a Terra tem apenas alguns milhares de anos de idade e que cada ser vivo e a terra mesmo vieram a existir durante seis dias consecutivos e contíguos de 24 horas. Seguir essa linha de raciocínio leva esta pessoa a ver a desconexão entre Genesis e a ciência como um desentendimento passageiro que, questão de tempo, va desaparecer – quando mais evidências científicas forem descobertas. Então a única coisa requerida é paciência. Afinal de contas, Deus falou aos profetas o que era para escrever, Deus é onisciente, e com certeza Deus não pode mentir, certo?

Se, por outro lado, o caminho da inspiração é entendido como sendo um pouco mais complicado – como na abordagem “Deus, a comunidade e os profetas” – então as descobertas da ciência podem ser levadas a sério na medida em que acontecem. Como consequência há uma séria e  e contínua tentativa de incorporar essas descobertas em uma compreensão sobre como são as coisas e como elas chegaram a ser assim. Há um reconhecimento de que quando Genesis foi escrito, tanto o profeta (o autor) quanto a comunidade à qual pertencia representarem uma realidade que consistia do céu, da terra, e era protegida do caos por uma abóbada sólida. Assim, a abóbada completava um ciclo a cada vinte e quatro horas e levava consigo “a luz maior”, a “luz menor” e as estrelas. Ou seja, há o reconhecimento de que “o céu e a terra” de Gênesis 1 difere enormemente do “universo” que conhecemos hoje.

Todos concordam que “Deus não pode mentir”. A questão aqui, entretanto, é um pouco diferente – ou seja – “Deus escreveu Gênesis?” Um número significtivo de cristãos poderia responder sim, Deus escreveu Gênesis;  de fato, Deus ditou Gênesis para os profetas, que por sua vez gravaram as palavras em placas, pele ou papiro. Há um único Autor, que em épocas diferentes e lugares diferentes, empregou vários secretários humanos.

Esta, obviamente, não é a única resposta possível à questão da autoria divina de Gênesis. Outros cristãos podem responder que a Bíblia, apesar de ser divinamente inspirada, tem conceitos, linguagens e lógicas que são essencialmente humanas. Como poderia ser de outra maneira? Certamente que a mente de Deus não pode ser expressa em linguagem humana. A inspiração divina iluminou e motivou o profeta, mas não eliminou a humanidade dele. E ser humano implica em ser condicionado pela própria inteligência, interesses, experiência e informação; e os interesses, experiência e informação são condicionados pelo contexto cultural da pessoa. Portanto, ao mesmo tempo que alguém diz que Deus foi o inspirador de Gênesis 1, pode também dizer que Deus não foi o escritor imediato.

Qualquer um que tenha realmente ouvido o que a Bíblia diz, e tenha refletido seriamente sobre sua “inspiração”, considera esta última perspectiva mais adequada à evidência bíblica. Os vários estilos literários e diferentes processos de pensamento tornam evidente que na Bíblia não temos apenas o resultado da inspiração divina, mas também a marca de uma grande diversidade de mentalidades humanas. Precisamos apenas olhar para (e realmente ouvir) a diversidade presente no conteúdo da Bíblia. Não só temos que Deus não é o autor direto da Bíblia, como os conceitos explanatórios que ela contém, também não são os conceitos explanatórios do próprio Deus.

Não é uma expressão de presunção reconhecer que a humanidade adquiriu uma imensa quantidade de informação adicional, novos conceitos e entendimentos gerais do mundo natural, desde que Gênesis 1 foi escrito. É totalmente razoável supor que boa parte dessa informação adicional e nova compreensão, representa algum tipo de progresso no entendimento de “como as coisas realmente são”. Enquanto pode fazer total sentido para o autor de Levítico listar os morcegos entre as aves impuras das quais não se deve comer (11:19), agora todos sabem que morcegos são mamíferos, e não aves. Da mesma forma, pareceu inteiramente apropriado ao escritor do evangelh0 de Mateus, representar Jesus descrevendo a semente de mostarda como “a menor de todas as sementes” (13:32), enquanto os botânicos de hoje sabem que as menores sementes são as das orquídeas.

Então, não é de surpreender que os conceitos que usamos para explicar a origem e operação do universo, diferem dos conceitos que a audiência que ouviu Gênesis 1 pela primeira vez, tinha. E porque nós tivemos mais tempo, oportunidade e meios de explorar essas coisas, e desenvolvemos formas de acumular vastas quantidades de informação, é evidente que nossos conceitos e entendimentos atuais  a respeito do mundo natural estão mais próximos da verdade. Entretanto, precisamos lembrar que nossa informação, conceitos e entendimentos também são limitados, e ainda há muito a aprender. Nossos conhecimentos atuais sobre o universo podem também ser vistos com estranhamento pelos nossos sucessores, assim como a cosmovisão apresentada em Gênesis 1, parece para nós.

O que temos em Gênesis 1 não é uma descrição da realidade física como entendemos que seja hoje, e sim, como essa realidade era entendida pelo autor do livro de Gênesis, e sua comunidade. […]

God, Sky & Land: Genesis 1 as the ancient hebrews heard it – Brian Bull and Fritz Guy – Amazon.com

Tão simples. Mas as pessoas preferem complicar e debater eternamente a respeito.


Finding Darwin’s God – Kenneth R. Miller

setembro 8, 2011

[…]No início deste capítulo, deixei claro que a crença religiosa não requer que sejam detectadas falhas ou inadequações na evolução. Esta pode não parecer uma ideia radical, mas está longe de ser uma ideia comum. Mais de uma vez, quando religiosos descobriram que sou biólogo, e acharam necessário dizer alguma coisa sobre a grande sombra do Darwinismo, eles escolhem o que obviamente esperam ser uma linha diplomática: “Bem, você provavelmente sabe melhor do que ninguém, que a evolução é apenas uma teoria. Certo?”

A evolução não é apenas uma teoria. Atualmente, usamos o termo “evolução” de duas formas diferentes, e não parece ser má ideia se palavras distintas fossem usadas para estes dois significados – história e mecanismo – para usá-las de forma correta.

O primeiro significado da evolução é a história, uma história natural e viva, onde as raízes do presente se encontram no passado.[…] Significa que o passado foi caracterizado por processos no qual as espécies atuais podem ser rastreadas em ancestrais similares, porém claramente diferentes. E significa que quanto mais nos movemos para trás no tempo, com mais pedaços e peças deste registro histórico, encontramos uma diversidade de formas de vida muito diferentes das que vemos e conhecemos hoje.  Isto é, uma descrição acurada sobre o que sabemos sobre o passado da vida no planeta.

Com relação a isso, a evolução é um fato tanto quanto qualquer outro que conhecemos em ciência. É um fato que os seres humanos não apareceram de repente nesse planeta, como criações sem ancestrais, e é um fato que os sinais desta ancestralidade são claros para a nossa espécie e para centenas de outras espécies e grupos de espécies. É verdade que o registro histórico é incompleto. sujeito a interpretações e aberto à revisões, especialmente à luz de novas descobertas. Não podemos saber ao certo o rumo que as descobertas vão tomar, e não podemos ter certeza se alguns destes sinais possuem erros ou mal entendidos que um dia  serão corrigidos. Sobre o assunto de saber se esses sinais existem ou não, podemos ser definitivos. Eles existem, e ponto. Evolução é um fato.

E no que diz respeito ao segundo significado da evolução, como teoria? A grande contribuição de Darwin, como tenho enfatizado, não foi o reconhecimento da evolução como processo histórico. Ao contrário, foi sua descrição de um mecanismo que poderia dirigir as mudanças evolutivas. A teoria evolutiva é um conjunto de explicações que procura esclarecer como esta mudança aconteceu  A teoria evolutiva leva em conta as contribuições relativas das mutações, variações e da seleção natural, e tenta entender como as ações interligadas de hereditariedade, sexo, probabilidade, ambiente e competição direcionam os detalhes da descendência com modificações.

A teoria evolutiva é um campo vigoroso e contencioso, como deve ser a boa ciência. Encontros científicos sobre este assunto são recheados de argumentações e discordâncias, e isso é uma coisa boa. O conflito intelectual, mesmo num nível pessoal, é bom para a ciência porque motiva os cientistas a testar suas ideias e as dos seus oponentes sob o escrutínio do experimento e da observação. A este respeito, o detalhado mecanismo pelo qual as mudanças ocorrem, é a teoria, mas teoria nesse contexto não significa que seja apenas um palpite sem fundamento. A teoria evolutiva não é um palpite sobre a natureza da vida, assim como a teoria atômica não é um palpite sobre a natureza da matéria, ou a teoria dos germes, pura especulação sobre a natureza das doenças. A teoria evolutiva é um conjunto bem definido, consistente e produtivo de explicações sobre como as mudanças evolutivas ocorrem.

A evolução é tanto fato quanto teoria. É um fato que as mudanças evolutivas acontecem. E a evolução é também uma teoria que procura explicar o mecanismo detalhado por trás destas mudanças.

Seria legal fingir, como muitos dos meus colegas cientistas fazem, que o estudo da evolução pode ser conduzido sem ter qualquer efeito na religião. De certa forma, invejam outros campos científicos – como a química orgânica ou a oceanografia – que podem prosseguir a toda velocidade, sem nunca terem que serem jogados na arena religiosa.[…]

[…]Existe alguma possibilidade de que os “geólogos do dilúvio” sejam cientistas genuínos e sinceros? É possível que sejam pioneiros solitários trabalhando numa grande e nobre tradição, lutando por respeitabilidade e, em última análise, para provar suas ideias?  Não penso que seja assim; e digo que não se trata de um julgamento de caráter, mas uma avaliação do comportamento científico deles. Se eles realmente acreditam na validade das suas interpretações da história fóssil, deviam estar loucos para explorar uma grande oportunidade científica: os coprólitos.

Coprólitos são fezes fossilizadas. Ao longo dos anos, os paleontologistas têm encontrado milhares destes fósseis, incluindo um notavelmente descrito num artigo da revista Nature, em 1984, com o título “A Kingsized Theropod Coprolite.” O tamanho e localização do objeto, indicam que foi produzido por um dinossauro carnívoro, provavelmente um Tiranossauro. O coprólito está recheado com grandes fragmentos de ossos parcialmente digeridos. Outros coprólitos estão também disponíveis, se nossos colegas preferirem, de mamíferos ancestrais, pleiossauros (répteis nadadores), e até de insetos. Para os criacionistas de Terra Jovem, estes fósseis apresentam uma oportunidade única para validarem suas ideias. Tudo que teriam que fazer, seria explorá-los e encontrar evidências de um único organismo contemporâneo. Grãos de pólen microscópicos de plantas modernas, seriam suficientes, no caso de dinossauros herbívoros. Se pudessem encontrar um pedaço de osso de atum, no estômago desses pleiossauros, sacudiriam o mundo da geologia, demonstrando que criaturas da antiguidade e do mundo contemporâneo coexistiram lado a lado antes do dilúvio, como eles sempre disseram. Os criacionistas de Terra Jovem não fazem este esforço. Eles se mantêm cuidadosamente longe de qualquer tipo de contato com evidências genuínas, como o fato de que o sistema digestivo dos pleiossauros estava cheio de amonitas, moluscos extintos, que viveram na mesma era geológica.[…]

[…]Então, como vimos, o designer (inteligente) produziu um organismo após outro, em lugares e sequências que poderiam ser posteriormente, erradamente interpretadas como a evolução, por uma de suas criaturas (pobre Charles Darwin! =P). E apenas para ajudar na composição deste mal-entendido, ele (o designer) se certificou de que os primeiros membros que desenhou, se parecessem com barbatanas modificadas, e que os primeiros maxilares que projetou, se parecessem com arcos branquiais modificados. Ele ainda se deu ao trabalho de garantir que os primeiros tetrápodes tivessem caudas como as dos peixes, e que as primeiras aves tivessem dentes, como os répteis. Tão pensador esse designer, que depois de ter desenhado mamíferos para viver exclusivamente em terra, redesenhou alguns poucos, como as baleias e os golfinhos, para viver na água – mas não antes de ter desenhado criaturas que viviam de forma dividida: tanto na terra quanto na água.  Trabalhando desta forma mágica, este designer escolheu criar formas exatamente intermediárias entre mamíferos terrestres e mamíferos aquáticos.

Seria legal, fingir que esta descrição não é nada mais do que uma polêmica irreverente, um puxão desagradável de orelha na oposição. Mas não é. É uma boa descrição, de um pouquinho do que qualquer defensor do design inteligente deve acreditar, no sentido de enquadrar suas crenças, com os fatos da história geológica. E isso é apenas o começo.[…]

Finding Darwin’s God: a scientist’s search for common ground between God and Evolution – Kenneth R. Miller

Recomendado!


Não é possível voar com uma asa apenas

novembro 26, 2010

por Nelson Costa Jr

“Na escala do cosmos só o fantástico tem condição de ser verdadeiro.”

Teilhard de Chardin

“Em alguns aspectos, a ciência superou em muito a capacidade da religião de criar uma admiração reverente. Por que será que nenhuma das grandes religiões examinou a ciência e concluiu: ‘Isto é melhor do que pensávamos! O Universo é muito maior do que diziam os nossos profetas, mais grandioso, mais sutil, mais elegante. Deus deve ser ainda maior do que imaginávamos!’? Em vez disso, dizem: ‘Não, não, não! Meu deus é um deus pequeno e quero que ele continue assim’. Uma religião, antiga ou nova, que acentuasse a magnificência do Universo revelada pela ciência moderna poderia atrair reservas de reverência e admiração ainda não canalizadas pelos credos convencionais. Mais cedo ou mais tarde, essa religião vai aparecer.”

(Sagan, Carl. Pálido ponto azul. Uma visão do futuro da humanidade no espaço. Trad. Rosaura Eichemberg. São Paulo: Companhia das Letras, 1996, p. 80.)

Não é possível voar com uma asa apenas – Nelson Costa Júnior


A teologia como ela é… e como podia ser…

outubro 24, 2010

por Arthur Peacocke

A teologia precisa ser verdadeira, livre e crítica; e para tratar e interpretar as realidades de tudo que constitui o mundo, especialmente os seres humanos e sua vida interior. Pode a teologia entrar na briga do intercâmbio intelectual contemporâneo, e se manter de pé e sobreviver por conta própria? Para conseguir isso, precisa se tornar uma exploração aberta na qual nada é isento de revisão. O modelo de “ponte” entre ciência e teologia precisa cair, e ser substituído por uma exploração conjunta de uma realidade comum, alguns aspectos da qual provarão, no final, ser os derradeiros –  e apontar para o divino. Deixe-nos agora observar como a teologia é praticada atualmente.

A TEOLOGIA COMO ELA É

O que encontramos? Uma variedade de procedimentos teológicos que não preenchem o critério anteriormente citado:

1. Dependência de um livro oficial: “A bíblia diz”. Mesmo aqueles que não são dados ao literalismo bíblico e ao fundamentalismo, ainda possuem o hábito de tratar o conteúdo da Bíblia (agora com mais de 2 mil anos de idade), como um tipo de oráculo, como se citações de autoridades do passado pudessem resolver questões da nossa época (como um biólogo recorrendo a Aristóteles, ou um médico a Avicenna, ou um químico, a Geber!). Cristãos comuns, receio, muitas vezes pensam que os ministros devem acreditar nisso, e são pagos para isso. No entanto, a biblioteca de livros que chamamos de Bíblia, foi constituída por um processo de revisão crítica e dialógica, repudiando e estendendo o trabalho e experiências das gerações anteriores – mesmo durante o período de composição do Novo Testamento.

2. Dependência de uma comunidade oficial: “A Igreja diz”, “o Padre (pastor) disse”, “o credo diz”, “o Magistério diz”. Aqui, a comunidade religiosa ouve e fala apenas para si mesma.  De acordo com suas interpretações, as doutrinas da igreja cristã têm a função de estabelecer a base para o discurso daquela comunidade, que elucida a gramática do seu próprio discurso interno, sem expor-se a qualquer julgamento ou razoamento externo.  Na melhor das hipóteses, pode ser fides quaerens intellectum, fé em busca de entendimento, mas mesmo isso prescinde de justificação racional da fides, a “fé”. Insisto que a única teologia defensável é aquela que consiste em compreender a fé buscando, intellectus quaerens fidem,na qual a “compreensão” deve incluir os mundos natural e humano, os quais a ciência tem revelado (não me refiro a excluir experiências estéticas e outras experiências da humanidade a partir deste entendimento). Não pode haver dentro das comunidades de fé, esse tipo de submissão a um dogmatismo revelado ou fundamentalismo doutrinal. Lembro das minhas experiências no Conselho Mundial de Igrejas, onde se  tinha por certo, que o que é o Evangelho era aceito e entendido universalmente – quando de fato não era.  A Palavra, se dizia, foi dada por Deus para a comunidade dos cristãos e tem de ser exposta – mas a sua autenticidade como Palavra de Deus nunca foi questionada. Assim, por mais que a fides seja explicada e enriquecida dentro da comunidade, falha em equipar a si mesma com os significados pelos quais poderia convencer aqueles que estão de fora, a levar tais afirmações a sério. Renunciou e repudiou ao que chamo de a lingua franca do discurso humano, dada por Deus – o uso do critério do razonamento. Como podem os cristãos, e outras comunidades religiosas, convencer outros de que o que proclamam, é um tipo de verdade pública, comparável em irrefutabilidade àquela que o mundo reconhece na ciência, e utiliza em suas aplicações?

3. Dependência de uma verdade a priori: Em algumas formas de teologia filosófica, as “verdades” internas abraçadas pela comunidade cristã são encaradas como, basicamente, verdades  a priori, às quais se chegou por raciocínio. Esse tipo de fundacionalismo é raro hoje, por causa do amplo condicionamento cultural daquilo que pode ser visto a priori.  Obviamente, esse tipo de teologia vai encontrar muita dificuldade  para chegar a um acordo com um mundo cujas realidades são descobertas pelas ciências.

A TEOLOGIA COMO PODERIA SER

Se a teologia cristã (e todas elas) quiser seguir os padrões intelectuais da nossa época, por exemplo, não dependendo de autoridades, ou não apelando para noções a priori, deve levar em conta o seguinte:

S = as realidades do mundo e da humanidade descobertas pelas ciências;

CRE  =  a herança judaica e cristã comunal, chamada de Experiência Clássica de Revelação;

WR = as percepções e tradições das outras religiões do mundo.

Daí, os dados da teologia são: S + CRE + WR.

Aqui, temos que infelizmente colocar WR de lado, mas note-se que há um segundo ponto crítico para a teologia cristã em relação às ciências, são os caminhos que as outras religiões têm seguido em relação ao ponto de vista científico, e o que pode ser aprendido com elas.

Mas, para nossos propósitos atuais, vamos considerar apenas S + CRE.

Se colocamos esses dois juntos, somos confrontados com um terceiro ponto fundamental, ou seja, uma revisão radical das noções passadas, se torna imperativa.

Temos CRE = T, onde T representa a teologia cristã.

Mas agora, temos S + CRE =  RT, onde RT representa uma teologia radicalmente revisada, a qual não convive confortavelmente com a teologia T, promulgada por muitas igrejas, e pregada na maioria dos púlpitos (eventualmente, é claro, precisamos de S + CRE + WR = GT, onde GT representa uma Teologia Global).[…]

[…]Qualquer teologia que não incorpora os novos conhecimentos científicos, está moribunda e condenada.

 

O texto acima foi retirado do livro Paths from Science towards God – the end of all our exploring – Arthur Peacocke


Uma teologia da evolução, e para a evolução

setembro 26, 2010

por Arthur Peacocke

Afirmo que, longe de a epopeia da evolução ser uma ameaça para a teologia cristã, é sim um estímulo para a teologia e também a base para uma compreensão mais abrangente e enriquecedora das inter-relações entre Deus, a humanidade e a natureza. Um argumento para a existência de Deus na “teologia-física” Anglo-Saxã (uma forma de teologia natural dos séculos XVIII e XIX), baseava-se em atribuir à uma ação direta de Deus o Designer, a existência dos intricados mecanismos biológicos.  Este argumento desabou, quando Darwin e seus sucessores, mostraram que esse design aparente pode evoluir por processos puramente naturais, baseados em processos cientificamente inteligíveis. O impacto inicial das ideias de Darwin na teologia é usualmente situado na lenda do debate entre o então bispo de Oxford com T. H. Huxley, no encontro da British Association for the Advancement of Science, num sábado, 30 de junho de 1860. Chamo de “lenda”, porque estudos históricos indicam que a história é uma construção posterior de Huxley e seus biógrafos, porque o impacto desse evento, atualmente muito citado, não foi tão grande na época. Não se encontra menção a ele em qualquer publicação entre 1860 e 1880. Depois disso, afirmações triunfalistas, a favor de Huxley e pela independência da profissão dos cientistas, começaram a aparecer em vários “Diários” e “Cartas”. Então, isso é realmente uma lenda, e hoje também um ícone do assim chamado conflito entre a religião e a ciência, biologia em particular, que todos nós herdamos. Mesmo no século XIX, muitos teólogos anglicanos, evangélicos e católicos, receberam positivamente a proposta da evolução. Entre os primeiros, podemos mencionar Charles Kingsley, o qual em seu “Water Babies”, afirmou que Deus faz “as coisas fazerem a si mesmas”; dos últimos, podemos citar Aubrey Moore, que em “Lux Mundi” (uma publicação de um grupo de anglicanos de Oxford), em 1889, escreveu: “O Darwinismo apareceu, e, sob o disfarce de um adversário, fez o trabalho de um amigo. Conferiu à filosofia e à religião, um benefício inestimável, por mostrar-nos que podemos escolher entre duas alternativas. Ou Deus é onipresente na natureza, ou está ausente dela”.    (23)

Deus e o Mundo

Imanência. Essa ênfase na imanência de Deus como criador, nos, com e dentro dos processos naturais do mundo desvendado pela ciência está certamente de acordo com tudo que as ciências têm revelado desde aqueles debates do século XIX. Um aspecto notável da explicação científica do mundo natura em geral, é o caráter contínuo da rede que foi construída ao longo do tempo: os processos aparecem em continuidade desde o início cósmico, no Big Bang, até o momento presente, e em nenhum ponto os cientistas modernos precisam invocar qualquer tipo de causa não natural para explicar suas observações e inferências sobre o passado. Os processos que ocorreram pode, como vimos, ser caracterizados como um surgimento, de novas formas de matéria, e uma organização hierárquica dessas formas por si mesmas, aparece no decorrer do tempo. Novos tipos de realidade que pode-se dizer terem emergido com o tempo.

A perspectiva científica do mundo, especialmente do mundo vivo, inexoravelmente nos imprime uma imagem dinâmica do mundo de entidades e estruturas envolvidas em mudanças contínuas e incessantes, e em processos que não cessam. Isso nos impele a re-introduzir em nosso entendimento da relação criativa de Deus com o mundo, um elemento dinâmico que está sempre implícita na concepção hebraica de um Deus vivo, dinâmico e em ação – mesmo que obscurecido pela tendência de pensar na criação como um evento passado.  Deus voltou a ser concebido como criando continuamente, dando existência continuamente ao que é novo; esse Deus é sempre o Criador; porque o mundo é uma creatio continua. A noção tradicional de Deus sustentando o mundo em sua ordem geral e sua estrutura, agora foi enriquecida por uma dimensão criativa e dinâmica – o modelo de Deus sustentando o mundo e dando existência contínua aos processos que possuem criatividade inata, atribuída por Deus. Deus está criando em todos os momentos da existência do mundo,  dentro e por meio da criatividade com a qual estão dotadas todas as coisas no mundo.

Tudo isso reforça a necessidade de re-afirmar com mais força do que em qualquer outra época nas tradições cristãs (e judaicas e islâmicas), que num sentido muito forte Deus é o criador imanente, criando dentro e por meio dos processos da ordem natural. Os processos por si mesmos, como descritos pelas ciências biológicas, são Deus atuando como criador, Deus qua Creator. Os processos não são o próprio Deus, mas a ação de um Deus no papel de criador. Deus dá existência no tempo divinamente criado, aos processos que por si mesmos se movem para o novo: assim Deus está criando. Isso significa que não temos que olhar para qualquer suposta lacuna nos processos, ou nos mecanismos, sobre os quais supostamente Deus estaria atuando como criador no mundo vivo .

Panenteísmo. (24) O teísmo filosófico clássico manteve a distinção ontológica entre Deus e o mundo criativo, que é necessário para qualquer teísmo genuíno, por conceber os mesmos como sendo de substâncias diferentes, cada um com atributos particulares. Havia um espaço fora de Deus, no qual as substâncias criadas vieram a existir. Esta forma de falar se torna inadequada por tornar extremamente difícil explicar a forma pela qual Deus está presente no mundo em termos de substâncias, as quais por definição, não podem estar internamente presentes umas nas outras. Deus só pode intervir no mundo num modelo desse tipo. Esta inadequação do teísmo clássico é agravada pela perspectiva evolucionária, a qual, como temos visto, requer que os processos naturais no mundo precisem ser considerados como ação criativa de Deus.  Em outras palavras, o mundo está para Deus, assim como nossos corpos são para nós como agentes pessoais, com a ressalva de que a ontologia final de Deus como criador é distinta daquela do mundo (panenteísmo, e não panteísmo).  Além disso, esse modelo pessoal de subjetividade encarnada (com essa ressalva essencial), representa melhor do que estamos impelidos a pensar, a ação constante de Deus no mundo, como vindo do interior, tanto em suas regularidades naturais quanto em quaisquer padrões especiais ou eventos. Estes três fatores – a forte ênfase na imanência de Deus no mundo, a preocupação de que Deus seja no mínimo, pessoal (como na tradição bíblica),e a necessidade de evitar o uso da substância nesse contexto – levam a uma relação panenteísta entre Deus e o mundo.  Panenteísmo, é, de acordo com isso, “A crença de que o ser de Deus inclui e penetra o universo inteiro, então cada parte do universo existe nEle, mas (ao contrário do panteísmo), o ser de Deus é mais do que o universo, e não é limitado pelo universo”. (25)

Esse conceito tem fortes fundações filosóficas e é bíblico, como foi cuidadosamente argumentado por P. Clayton (26) – lembrando a  estada de Paulo em Atenas, quando ele disse, a respeito de Deus, que “nEle nós vivemos, nos movemos e somos.” (27)  Isso de fato está profundamente enraizado na tradição cristã oriental.

A Sabedoria (Sophia) e a Palavra (Logos) de Deus. Estudiosos bíblicos têm, em décadas recentes, têm  enfatizado a significância dos temas centrais da assim chamada literatura de Sabedoria (Jó, Provérbios, Eclesiastes, Eclesiástico, e Sabedoria). Nesse conjunto de escrituras, a figura feminina da Sabedoria (Sophia), de acordo com J. G. Dunn, é uma forma conveniente de falar sobre Deus agindo na criação, revelação, e salvação; a Sabedoria nada mais é do que a personificação da atividade de Deus. (28) Essa Sabedoria dota alguns seres humanos com uma sabedoria pessoal que é enraizada em suas experiências concretas e em suas observações sistemáticas e ordinárias do mundo natural – o que podemos chamar de ciência.  Mas não está confinada a isso, e representa a destilação das maiores experiências humanas, éticas e sociais, e também as experiências cosmológicas, já que o conhecimento sobre os céus também figurou entre os conhecimentos dos sábios. A ordem natural é avaliada como um presente e fonte de maravilhamento, algo a ser celebrado. Todos os tipos de sabedoria, gravadas como um padrão no mundo natural e na mente dos sábios, são apenas uma imagem pálida da sabedoria divina – esta atividade distinta de Deus em relação ao mundo.

No Novo Testamento, Jesus veio a ser considerado como “aquele que encarnou o poder criativo de Deus e a sua sabedoria salvadora (particularmente em sua morte e ressurreição), que podemos identificar como ‘o poder de Deus e a Sabedoria de Deus.’ [1 Cor. 1:24].”(29)

Esta sabedoria é um atributo de Deus, personificada como feminina, e tem um significado especial para teólogos feministas (30), um dos quais argumentou, com base numa ampla seleção de fontes bíblicas, que o feminino em Deus se refere a todas as pessoas do Deus cristão triuno.  Então, a Sabedoria (Sophia), se torna a “face feminina de Deus, expressa em todas as pessoas da Trindade. “(31) No contexto presente, é pertinente que esse conceito importante de Sabedoria (Sophia), une intimamente a ação divina de criação, a experiência humana e os processos do mundo natural. Por conseguinte, constitui um recurso bíblico para imaginar o panenteísmo que temos defendido.

Assim também é com o conceito diretamente relacionado de Palavra (Logos) de Deus, o qual é definido como (32) existindo eternamente como um modo do ser de Deus, como ativo na criação, e como expressão própria do ser de Deus, e impresso nas costuras e tramas da ordem criada. Isso parece ser uma fusão do amplo conceito hebraico de “Palavra de Deus”, como a vontade de Deus na atividade criativa, em conjunto com o Logos divino do pensamento estóico.  Este último é o princípio da racionalidade manifesto tanto no cosmos como na razão humana (chamada de logos pelos estóicos). De novo, temos uma noção panenteísta que une, intimamente, três faces de uma atividade integrada e encadeada: o divino, o humano e o (não humano) natural. É, desnecessário dizer, significativo que para os cristãos, este logos “se fez carne” (33), na pessoa de Jesus Cristo.

Um universo sacramental. A epopeia da evolução, como tenho me referido a ela, relata em sua extensão e na sua continuidade, como, ao longo das eras, as potencialidades mentais e espirituais da matéria têm se atualizado, sobretudo no desenvolvimento do complexo “cérebro humano num corpo humano”. O campo flutuante quântico original, ou a sopa de quarks, ou seja o que for, produziu em doze ou mais bilhões de anos, um Mozart, um Shakespeare, um Buda, um Jesus de Nazaré – e você e eu!

Cada avanço nas ciências biológicas, cognitivas e psicológicas, mostra os seres humanos como unidades psicossomáticas – pessoas. A matéria manifestou qualidades pessoais, numa combinação única de capacidades físicas, mentais e espirituais. (Uso “espiritual” como indicando relativos a Deus de uma forma pessoal). Para o panenteísta, que vê Deus trabalhando dentro, com e por meio dos processos naturais, este único resultado dos processos evolucionários, corrobora o fato de que Deus usa cada processo como instrumento de Seus desígnios, e como um símbolo da natureza divina, que é um meio de chegar aos Seus desígnios.[…]

[…]A Humanidade e Jesus Cristo numa Perspectiva Evolucionária

Vimos que a humanidade é incompleta, inacabada, está  muito abaixo dos valores elevados da verdade, beleza e bondade que Deus, sua fonte final, teria que fazê-la atingir, para levá-la a uma relação harmoniosa com Ele. Ainda não estamos adaptados totalmente ao “ambiente” final e eterno de Deus.

Não foi muito tempo depois de Darwin ter publicado A origem das espécies, que alguns teólogos começaram a discernir o significado da afirmação cristã central e distintiva da Encarnação de Deus na pessoa de Jesus Cristo, como especialmente congruente com uma perspectiva evolucionária. Assim, mais uma vez em Lux Mundi, em 1891, encontramos J. R. Illingworth claramente afirmando: “… em linguagem científica, a Encarnação pode-se dizer ter introduzido uma nova espécie no mundo – o homem divino, transcendendo a humanidade passada, a humanidade transcendendo o resto da criação animal, e comunicando sua energia vital por processos espirituais, para as gerações seguintes…”(36).  A ressurreição de Jesus convenceu os discípulos, inclusive Paulo, que essa união com Deus é o tipo de vida que não pode ser quebrada pela morte, e é capaz de estar em Deus. Jesus manifestou o tipo de vida humana a qual, como se acredita, pode se tornar vida abundante com Deus, não só aqui e agora, mas eternamente, além da barreira da morte. Por isso o seu imperativo “Sigam-me” constitui um chamado para a transformação da humanidade num novo tipo de ser humano transformado.  O que aconteceu com Jesus, pode acontecer com todos.

Nessa perspectiva, Jesus Cristo, tem nos mostrado o que seria possível para a humanidade. A atualização dessa potencialidade pode ser considerada como a consumação dos desígnios de Deus, já manifesta de forma incompleta na humanidade em evolução.[…] Jesus Cristo é portanto considerado, dentro do contexto desse complexo de eventos do qual participou, como o paradigma revelado do que Deus planejou para a humanidade. Nessa perspectiva, ele representa a consumação desse processo evolutivo e criativo que Deus tem impulsionado dentro e por meio do mundo.[…]

[…]Na Terra, a epopeia da evolução é consumada pela Encarnação, numa pessoa humana, da auto-expressão cósmica de Deus, da Palavra de Deus – e na esperança que isso dá a todas as pessoas, de se unirem com a Fonte de todo Ser e Vir a ser, que é “o Amor que move os céus e as estrelas.”  Gostaria de lembrar que, no segundo século, Irineu disse, nos convidando a contemplar: “A Palavra de Deus, nosso Senhor Jesus Cristo, que, com seu imenso amor, quer fazer de nós aquilo que Ele mesmo é.” (Adv. Haer., V praef.)

A Theology of and for evolution – Arthur Peacocke

Não posso dizer que concordo exatamente com tudo o que o autor afirmou, mas coloco o texto aqui, para que gere reflexão. Segundo o autor, o ideal de Deus para o ser humano é o que foi encarnado em Jesus. Porém, cada ser humano, mesmo tendo potencial de transcender a si próprio, e se tornar mais parecido com Jesus, tem a liberdade de decidir se deseja participar desse caminho evolutivo ou não. Envolve coisas como negar a si mesmo, carregar a cruz, amar os inimigos, dar a outra face e etc, coisas que exigem que a pessoa esteja, todo o tempo, tomando decisões conscientes, no sentido de agir conforme esse modelo, e sujeito a falhar nesse processo, muitas vezes. O ser humano por si mesmo, não tende a seguir esse modelo naturalmente. E Deus não coage ninguém. Deus não impõe sua presença nos mecanismos do universo e da vida, não deixa claras as formas pelas quais atua no universo, para que cada ser humano possa escolher se deseja ver o mundo de uma perspectiva que inclui Deus, ou não, e viver de acordo com a perspectiva escolhida.

E os discípulos de Jesus, aqueles que, conscientemente, escolhem tentar viver esse modelo “alternativo” de ser humano proposto por Deus, são facilmente reconhecíveis. Se Deus não deixa óbvia a sua presença nos mecanismos que regem o universo e a vida no nosso planeta, na vida dos discípulos, a presença dEle se torna inegável. Os discípulos são Suas cartas vivas.